QUANDO O CONTROLE SE TORNA INTOLERÂNCIA: UM OLHAR COMPORTAMENTAL.
Neste texto, exploro o comportamento controlador a partir da análise do comportamento. Mostro que, muitas vezes, o controle excessivo não é uma simples vontade de dominar, mas uma tentativa aprendida de reduzir o desconforto diante da imprevisibilidade e da diferença. Falo sobre como esse padrão pode estar sustentado por reforçamento negativo e por um repertório limitado de enfrentamento. Reforço a importância de, na prática clínica, ampliar o repertório do cliente para lidar com a variabilidade do outro, promovendo relações mais flexíveis, sensíveis e menos pautadas na defesa constante.
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Maicon Danese
6/20/20253 min read


No senso comum, uma pessoa controladora costuma ser vista como alguém que quer dominar tudo ao seu redor por “pura vontade” ou “desejo de poder” (claro que há outras causas possíveis, mas não vamos ampliar tanto aqui). Entretanto, sob a lente da análise do comportamento, esse fenômeno exige uma compreensão mais cuidadosa. Muitas vezes, o que aparece como necessidade de controlar o ambiente revela, na verdade, um incômodo profundo diante da variabilidade do comportamento alheio. Não se trata apenas de alguém que gosta de ter o controle, mas de alguém que aprendeu, em sua história de contingências, a evitar o desconforto causado pela imprevisibilidade e pela diferença.
Pessoas que apresentam padrões de constante supervisão do outro e controle rígido nem sempre o fazem por motivação direta ou por uma necessidade contextual evidente. Em muitos casos, trata-se de uma tentativa de minimizar a “ansiogeneidade” provocada por comportamentos percebidos como errados, indesejados ou simplesmente diferentes do que foi aprendido como certo. Ao longo de suas vidas, essas pessoas podem ter vivenciado contextos nos quais a previsibilidade teve papel crucial para evitar punições, críticas ou sofrimento emocional.
Nessas condições, condicionou-se o seguimento de regras estritas, organizando o mundo em categorias fixas que operam como estratégias de proteção (um nome mais bonito para o que seria, funcionalmente, um conjunto de estratégias de fuga ou esquiva; afinal, gostamos mesmo de dar nomes mais digestivos as nossas limitações de repertório). O comportamento de controle, nesse caso, funciona como uma forma de organização do ambiente, sendo mantido por reforçamento negativo: a redução do desconforto gerado pela incerteza.
O problema surge quando esse alívio depende exclusivamente da submissão do outro às regras pessoais daquele que controla. A partir desse ponto, observa-se uma confusão entre o desejável e o indesejável — vale, aqui, a leitura do texto de Hélio Guilhardi sobre essa distinção, para quem quiser aprofundar (https://itcrcampinas.com.br/pdf/helio/classificacao.pdf). A linha que separa o certo do errado se estreita perigosamente, e qualquer comportamento fora do esperado é interpretado como uma afronta a ser corrigida, mesmo que à força.
Esse padrão se afasta do que é mais comumente observado quando a reação ao comportamento do outro se dá com insensibilidade às circunstâncias que o produzem. Não se trata apenas de uma escolha, mas, muitas vezes, de um repertório empobrecido, em que as únicas respostas disponíveis para lidar com a diferença são a imposição, a autoridade e a rigidez. Quando faltam outras formas de agir diante da variabilidade do outro, o controle deixa de ser uma estratégia funcional e passa a operar como uma repetição defensiva. Em vez de contato, há exigência. Em vez de escuta, há interrupção.
O controle, nesse ponto, se converte em contracontrole — uma tentativa de reorganizar o outro para que ele se encaixe em um molde já previamente definido. Controlar o outro pode parecer, à primeira vista, um problema de caráter ou uma simples vontade de mandar. Mas, quando analisado com mais profundidade, é possível reconhecer nesse comportamento uma história aprendida — marcada pela tentativa de reduzir desconfortos e manter alguma estabilidade emocional. No entanto, quando esse controle se torna excessivo e inflexível, ele empobrece as relações, bloqueia possibilidades e intensifica o sofrimento de quem controla e de quem é controlado.
Na prática clínica, é essencial identificar quando o comportamento de controle deixou de operar de forma saudável e passou a funcionar como uma barreira para a convivência e o vínculo. Mais do que eliminar o controle, o objetivo terapêutico é ampliar o repertório do sujeito para lidar com a diferença, com a incerteza e com a liberdade do outro — criando, assim, condições para que a convivência se torne um espaço de crescimento mútuo, e não de defesa constante. Não se trata de ensinar o outro a ceder menos, mas de ajudar o cliente a sustentar relações onde o controle não precise mais ser seu único refúgio.
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